A energia está cara e são vários os motivos que explicam o alto custo da eletricidade e dos derivados de petróleo: falta de chuvas, impostos, guerra. Mas, no Rio, o que já custa muito fica ainda mais caro por causa da criminalidade. Quadrilhas dominam serviços básicos em muitas comunidades, desde a venda de botijão de gás ao controle da energia elétrica, e impedem as fiscalizações.
E o prejuízo atinge o consumidor: de cada R$ 100 pagos em cada conta de luz, cerca de R$ 10 servem para compensar perdas como essas e de outros tipos de gato, segundo um estudo da Fundação Getúlio Vargas.
Os furtos de luz já representam mais da metade da energia distribuída pela Light (53,8%). A concessionária atende 31 municípios, incluindo o Rio de Janeiro, e não tem conseguido conter esse crime ao longo dos últimos 5 anos.
Em 2017, 36,1% da energia distribuída era furtada. Em 2018, saltou para 49,7%; em 2019, 54,1%; em 2020, chegou a 55,3%, o maior índice de perdas desde 2008; e no último trimestre de 2021, quase 54%.
E a maior parte desse prejuízo é pago por quem tem as contas em dia.
Em 2020, a Agência Nacional de Energia Elétrica autorizava a Light a repassar 36% das perdas para os consumidores. Este ano, a Aneel autorizou que a concessionária repasse 40% das perdas.
O RJ2 perguntou para a Light quanto, em média, de cada conta se devia a esses furtos, mas a concessionária não respondeu.
A produção procurou então o Centro de Estudos e Regulação em Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas, que fez uma análise e concluiu que cerca de 10% do valor da conta paga por todos os consumidores serve para ressarcir a Light.
Ou seja, de cada R$ 100 pagos na conta de luz, aproximadamente R$ 10 são pagos por causa de gatos feitos por outras pessoas.
O consumidor da Light é o terceiro mais afetado pelos furtos de energia do país, atrás apenas das distribuidoras do Amazonas e do Amapá.
O diretor comercial da Light diz que o restante do prejuízo entra na conta da concessionária.
“Tem uma parcela de cerca de 13% que a própria Light acaba arcando com prejuízo. Isso representa para a Light um prejuízo de cerca de R$ 600 milhões por ano em que a empresa tem que desembolsar sem ter o retorno na tarifa de energia”, diz Thiago Guth.
O que a Light perde por ano com os gatos daria para iluminar a cidade de Nova Iguaçu por 4 anos.
Os furtos também passam pelo domínio do crime organizado. Nas comunidades controladas por traficantes ou milicianos, a população é obrigada a fazer gatos nos postes e ainda pagar para os criminosos pela energia.
Os criminosos impedem a fiscalização da concessionária e cobram a conta eles mesmos.
“Se você pagava R$ 400 de luz na Light, você começa a pagar R$ 200. Eles cobram a metade do que você estava pagando. Vão na tua residência, perguntam quanto que você estava pagando, quanto você paga, o valor. Aí, eles vêm e fecham contigo. Eles ainda dão garantia que os funcionários da Light não vão vir em represália”, diz um morador de Curicica.
A Light diz que nessas áreas os medidores eletrônicos estão sendo transferidos para caixas blindadas no alto dos postes. E que atua com plano de combate as perdas de energia.
“A gente usa técnicas de inteligência artificial onde a gente consegue descobrir isso em nosso território e a gente vai com apoio, muitas vezes até local, do poder público, para que a gente possa ir lá e retirar o furto de energia”, fala o diretor da Light.
“Eles mandam o cara botar o fio que entra no relógio, sai direto agora lá no poste, entendeu? Ao invés de pagar a conta de luz na Light, você pega o fio e agora coloca direto lá no poste”.