Quatro dias depois de ficar em silêncio diante dos delegados da Polícia Federal que investigam sua participação no planejamento de um golpe de Estado no Brasil, Jair Bolsonaro fez de cima do carro de som do ato deste domingo na avenida Paulista uma declaração que pode complicar sua situação no inquérito, por ter sido encarada pelos investigadores como uma confirmação de que ele tinha conhecimento da minuta de golpe. “Agora, o golpe é porque tem uma minuta de um decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenham santa paciência. Golpe usando a Constituição”, disse o ex–presidente no único momento do discurso de mais de 20 minutos em que se propôs a explicar as acusações da PF contra ele.
Para policiais federais envolvidos na apuração do caso– alguns dos quais inclusive acompanharam in loco a fala do ex-presidente –, embora tivesse a intenção de sustentar que não houve tentativa de golpe, ele admitiu que havia uma minuta. Esses investigadores anteciparam à equipe da coluna de Malu Gaspar que a transcrição da fala será incluída no inquérito.
“Deixo claro que estado de sítio começa com o presidente da República convocando os conselhos da República e da Defesa. Isso foi feito? Não. Apesar de não ser golpe o estado de sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da República e da Defesa para se tramar ou para se botar no papel a proposta do decreto do estado de sítio", afirmou Bolsonaro durante a manifestação.
Os policiais federais vinculados com as investigações contra Bolsonaro apontam que, apesar de usar sua fala para dizer que não houve tentativa de golpe, o ex-presidente admitiu que havia uma minuta e que tinha conhecimento dela.
O documento investigado foi encontrado na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, ainda em janeiro de 2023. O texto é um rascunho que prevê a instalação de um "Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral" para "garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção do processo eleitoral presidencial do ano de 2022".
A minuta se alinha ao raciocínio apresentado por Bolsonaro durante a reunião ministerial de julho de 2022, em que pediu para que membros do Conselho de Transparência do TSE solicitassem o adiamento das eleições por falta de cumprimento da lisura do sistema eleitoral.