Há pelo menos um ano, a jornalista Juliana Arini tenta denunciar o bullying que seu filho, um estudante de Agrimensura do 2º ano do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), vem passando no Campus Cuiabá. O aluno, que é portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA), sofre com ameaças, humilhações e agressões dentro da unidade escolar.
Nesta última segunda-feira (2), Juliana foi com o filho na Delegacia do Menor (DEA) registrar a terceira denúncia de agressão, além de exame de corpo delito na Perícia Oficial (Politec). Ele descia uma escada da escola, quando os agressores o empurraram.
Conforme a mãe, em setembro de 2018, ele foi jogado pelos bullies (agressores que praticam bullying) do primeiro andar do IFMT, caindo no telhado do anfiteatro Hélio Vieira, que está em construção. Ele não sofreu lesões mais graves porque um tapume o segurou.
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“Foi um guarda do IFMT que o tirou lá de dentro. O IFMT não me contou, falaram para mim que ele que tinha pulado. Nunca me mostraram as imagens das câmeras de segurança”, conta. O aluno, com medo de represálias, ainda tentou esconder da mãe o fato.
Fora as agressões, o adolescente sofre com diversas humilhações, que conforme Juliana, são feitas por um grupo com cerca de 15 alunos, que envolve outras salas. Entretanto, existem três estudantes que “encabeçam” os ataques.
Dentre as ameaças, os alunos já quebraram o celular dele três vezes, e também costumam esconder sua mochila. Além disso, já deram tapas no rosto do adolescente, e ficam zombando do comportamento dele. “Fizeram um trote com ele, para levar uma faca pra escola, para ‘matar um urso’. Porque ele é muito literal, se você fala para um autista ‘se você andar mil léguas, você vai ganhar um prêmio’, ele realmente vai andar mil léguas. E era para matar um urso pra conquistar uma menina”, detalha.
Após observarem o bullying, outros alunos foram até o Grêmio Estudantil registrar queixa contra os bullies. “O grêmio estudantil acabou amigo dele, fizeram até um processo por conta desse bullying. Os únicos amigos que ele tem lá, são do grêmio, que começaram a cuidar um pouco dele. Se ele está sozinho, é cacetada”.
Por conta dos ataques, o adolescente acabou entrando em depressão. “Ele acha que a culpa é dele, a autoestima dele está péssima”, disse. “Parece que eles preferem que aconteça o pior, dai vão fingir que não é culpa da escola. E é sempre assim, a culpa é dele, a culpa é minha. A culpa é dele, porque ele existe, ele irrita as pessoas. Ele já veio com esse discurso pra minha cara”.
Por não ter respostas, a jornalista procurou entrar na Justiça. De acordo com ela, o Ministério Público Estadual demorou um ano para responder sua representação, e estão analisando as provas. “A advogada entrou com pedido na Justiça estadual e a Justiça negou, dizendo que não tinha indícios de bullying. Quer dize que tem que estar morto pra ter indício de bullying?”, questiona.
Lei da inclusão nas escolas
Além de não ter respaldo da diretoria e reitoria do IFMT sobre os ataques, Juliana relata que na escola não existem monitores para acompanhar alunos portadores com deficiência (PcD), tampouco os professores são especializados para lidar com esses adolescentes.
“Eu estou desde o ano passado pedindo a Lei do PNE, que inclui autistas, e lá está muito tácito: o aluno portador de necessidades especiais tem direito ao monitor. Não há monitor no Campus Cuiaba do IFMT. Lá tem 13 portadores com deficiência, tem outro autista, que faz Informática, com outros espectros. E nenhum deles tem um monitor”.
Após ter o pedido de transferência para o Campus Bela Vista do IFMT, a mãe acabou optando por matricular o filho em uma escola particular. “Ele vai perder o direito de ter um ensino técnico e público, que talvez seja a única profissão que tenha na vida, pra ir pra uma escola privada. Porque não tem mais condição”, desabafa.
Outro lado
A reportagem entrou em contato com a assessoria do IFMT Campus Cuiabá, que informou que a escola puniu os alunos responsáveis pelas agressões no último ano. Existem três etapas de punições, que pode ser advertência escrita e na presença dos pais, suspensão e expulsão da unidade escolar. Entretanto, o colégio ainda não tomou conhecimento da agressão de segunda-feira (2), pois a mãe não se dirigiu ao setor responsável da escola para denunciar essa nova agressão. A escola irá tomar as medidas cabíveis relativas ao ataque.
Ainda conforme a assessoria, o IFMT vem acompanhando os casos de bullying e uma servidora está responsável pelo estudante, que abriu um Processo Administrativo Disciplinar para apurar o caso. Além disso, o número de estudantes com deficiência aumentou 50% e o colégio está aprendendo a lidar com a situação. O IFMT tem buscado discutir com Governo a contratação de monitores, além de orientar e qualificar os professores e corpo de servidores técnicos.