A concessionária que administra a BR-163, onde ocorreu o acidente que matou oito pessoas nessa terça-feira (17), arrecadou R$ 2,9 bilhões em pedágio desde o início do funcionamento das praças, em setembro de 2015, até abril deste ano. Quando o contrato foi firmado entre o governo federal e a Rota do Oeste, ficou estabelecido um investimento para todas as frentes de R$ 4,6 bilhões, sendo R$ 2,3 bilhões somente para a duplicação, que ainda não ocorreu.
Um trecho de 453 km que corta Mato Grosso já deveria ter sido duplicado, conforme previsto em contrato, há oito anos. Até agora, a duplicação foi feita em apenas 120 km, restando 328 km para o término das obras.
As obras de infraestrutura estão paradas desde 2016, o que causou um cenário de prejuízo ao usuário e empresas de transporte que trafegam pela região.
A Rota do Oeste alega dificuldades financeiras para continuar cuidando da estrada e, por isso, não pôde realizar as manutenções necessárias para atender o fluxo de veículos na pista.
“A duplicação foi interrompida após a conclusão de 120 km no sul do estado, por diversos motivos alheios à vontade da Rota do Oeste. Entre eles citamos principalmente a não concessão do financiamento público conforme previsto, aumento jamais visto nos insumos derivados do petróleo (asfalto e combustíveis) e a queda na projeção de tráfego devido aos maus momentos econômicos do país, entre outros”, diz.
De acordo com a empresa, desde o início da assinatura do contrato, em março de 2014, até abril de 2022, foi investido R$ 3,5 bilhões, considerando investimento em obras, recuperação do pavimento, atendimento operacional e pagamento de imposto a 19 municípios.
A concessionária diz ainda que todo o valor arrecadado em pedágio foi integralmente revertido para a manutenção dos 850 quilômetros sob concessão.
O governo de Mato Grosso, por sua vez, cita que a falta de infraestrutura na BR não é culpa do estado, já que o trecho é de responsabilidade federal. O estado diz que, apesar disso, tem cobrado uma solução do governo federal para que traga mais segurança aos usuários que dependem da rodovia.
“É um absurdo a concessionária cobrar pedágio dos mato-grossenses, mas deixar a estrada em péssimas condições e não fazer a duplicação, que é uma obrigação dela. O governador já esteve várias vezes em Brasília para tratar do assunto e continuará a cobrar, junto com a bancada federal, uma solução urgente para esta questão”, diz a Secretaria Estadual de Infraestrutura (Sinfra-MT), em nota.
O Ministério de Infraestrutura informou que, em 1º de abril deste ano, assinou um contrato com a empresa Via Brasil, em que garantiu R$ 1,76 bilhão em investimentos pelos próximos 10 anos em trechos da BR-163.
As melhorias estão previstas para ocorrerem em até cinco anos após a concessão. A proposta também prevê a construção de 42,87 quilômetros de faixas, 30 km de vias marginais, oito dispositivos de interconexão em desnível, sete passarelas de pedestres e implantação de 340 km de acostamentos.
A tragédia da batida entre o ônibus e a carreta repercutiu entre os deputados estaduais. Segundo o deputado Lúdio Cabral (PT), a rodovia se tornou, na prática, um local onde se fazem vítimas todos os dias.
"O estado pode, se quiser, contribuir. A responsabilidade é do governo federal para assegurar as condições para que ela não seja o que é hoje. Acho também que caberia ao governo estadual e à própria Assembleia uma pressão sobre o federal para superar um problema que se arrasta há anos. Faltou capacidade política de pressão, tanto do estado quanto do parlamento, para enfrentar essa situação", disse.
Já Ulysses Moraes (PTB) destacou que governos anteriores também têm responsabilidade sobre o que acontece todos os dias na rodovia.
"É inadmissível uma obra que era para ter terminado em 2019, com contratos mal feitos de governos passados que complicaram com a vida de muitas pessoas. A gente tem que se solidarizar com as vítimas da BR-163. É inaceitável que o governo estadual não tenha tomado nenhuma decisão dura contra essa empresa", afirmou.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional de Mato Grosso, também se manifestou após o acidente, cobrando providências mais duras em relação à concessão e melhorias na BR.
"Diante de mais uma tragédia, a OAB, além de externar o profundo pesar pela morte de oito pessoas, vem manifestar pela necessidade de uma convergência de ações e esforços em torno das questões que afetam a BR. Por meio da Comissão Especial da BR-163, a OAB-MT vem sendo voz ativa na busca de soluções práticas e concretas para o desenrolar dessa questão", disse a presidente Gisela Cardoso.
Trecho da BR-163 entre Cuiabá e Sinop — Foto: Sinfra-MT/Divulgação
A Rota do Oeste ganhou o certame da BR-163 em 2014. Havia um prazo de 30 anos para cumprir com as melhorias na estrada, mas a empresa não cumpriu e, no final do ano passado, ela protocolou um pedido de devolução da responsabilidade sobre a rodovia.
O Ministério da Infraestrutura aceitou, no começo deste mês, a devolução amigável. O novo edital deve ser publicado somente após aprovação de um decreto presidencial. Em seguida, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) irá abrir o leilão para escolher uma nova empresa a fim de administrar a rodovia.
Devido à devolução, alguns trechos estão passando por um processo de "relicitação", segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Um processo como esse pode levar até dois anos. Nesse meio tempo, a concessionária assina um termo aditivo e assume novas obrigações, como manutenção e suporte aos usuários.
Em fevereiro deste ano, o prefeito de Sorriso, Ari Lafin, (PSDB), anunciou, por meio do Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Econômico Social e Ambiental (Cidesa), que pretende assumir a administração de parte da BR-163 para concluir a duplicação da rodovia.
O consórcio, formado por 15 municípios, quer realizar uma fusão entre os municípios, em parceria com entidades organizadas, produtores rurais e a iniciativa privada para dar andamento às obras na estrada.